Bloqueio de escritor tem a fama de ser o papão entre os papões que aterrorizam os autores, porém, uma força tão temível, senão mesmo mais, é a compulsão de procrastinar.
O bloqueio acontece quando temos uma ideia e não a conseguimos passar da mente para o mundo físico ou simplesmente quando não nos ocorre nada para escrever, tornando-se a folha em branco o maior dos adversários, assim como o mais aterrador. Tão intimidante é o bloqueio que para se protegerem dele alguns autores rodeiam-se de diversos hábitos que mantêm como um ritualismo supersticioso.
Procrastinar é diferente, consistindo, para um escritor, em inventar desculpas para adiar escrever. Pode ter a mesma origem do bloqueio, contudo, o mais ridículo é que muitas vezes sabemos exactamente o que queremos escrever e como, só que evitamos fazê-lo.
Porquê? Não creio que haja uma resposta única e muito menos simples… A meu ver, precisamos ter em conta que escrever é algo muito íntimo. Independentemente de o desejarmos ou não, expomos parte de nós ao fazê-lo e esse género de vulnerabilidade pode ser intimidante, acarretando diversas inseguranças. Medo de falhar, medo de sermos julgados, medo de desiludir… Mesmo quando só escrevamos “para a gaveta” existe sempre a possibilidade de nos desiludirmos, de ficarmos aquém, o que pessoalmente acho muito mais intimidante do que qualquer opinião externa, por mais maldosa que seja. Enfrentar as críticas é algo que um escritor tem de se habituar, comes with the territory. As feitas com pé e cabeças são cruciais para evoluirmos e as restantes, movidas por simples ódio, ajudam a “criar calo”. Escritor que não as queira enfrentar, mais vale fechar-se numa “redoma de vidro” ou desistir de escrever. Mas quando a crítica vem de dentro não há fuga possível. Quando investimos num projecto apenas para perceber que foi um erro crasso, esse golpe corta muito fundo... Por isso, é fácil deixarmos-nos seduzir pela ideia de ir adiando, porque enquanto o livro, conto ou o quer que seja, existir apenas como conceito, em vez de algo físico, podemos sempre iludirmo-nos, pensando que é perfeito.
Outro factor para procrastinar é a desmotivação. Pelo mais variados motivos, podemos dar por nós a questionar a validade de gastar tempo, esforço e, sejamos honestos, um pouco da alma, em algo que talvez compense ou não. Todos já passamos pelo mesmo e, por mais de nos tentemos convencer do contrário, nem sempre é fácil.
Obviamente nem todas as inseguranças e desmotivações são tão graves, porém, não precisam de o ser para catalisar um acto de procrastinação. Por vezes nem nos apercebemos que o estamos a fazer, à medida que cometemos actos de auto-sabotagem.
“Ó Vitor, isso de procrastinar parece uma palavra cara para preguiça…” Aí é que está a parte estranha. Procrastinar não é preguiçar, muito pelo contrário. Preguiça seria fazer nada, procrastinar é inventar trabalho para evitar fazer o que era suposto. Um escritor a procrastinar faz tudo, menos escrever aquilo que devia, como por exemplo, decidir que “parecendo bem, era boa ideia organizar os livros por body count” ou “se calhar não seria pior varrer o chão pela enésima vez”. Telefonam-lhe para ir beber um café e ele, em vez de adiar, agarra-se a essa desculpa como se fosse um bóia e a página em branco o Pacífico.
Cura para procrastinação? Suponho que cada um tenha a sua mezinha. Comigo ficar num local com poucos estímulos visuais e auditivos, onde me obrigo a ultrapassar a hesitação inicial, costuma funcionar.
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