Este texto foi feito no rescaldo do Fórum Fantástico 2011 e deixado na gaveta (ou no armário?) porque na altura preferi explorar "Behind the Scenes: Influências". Um debate com uma colega fez-me repescá-lo.
No decorrer da apresentação “Os Sexos na Literatura Fantástica”, durante o Fórum Fantástico 2011, uma das questões abordadas foi a aparente ausência de personagens homossexuais nos livros analisados (sublinhe-se “aparente”, mas isso é outra guerra).
Contrariamente a alguns espectadores isto não me causou surpresa, pois tenho consciência que lidamos com livros, não catálogos da Benetton imbuídos da necessidade patológica satisfazer o politicamente-correcto, representando todo o espectro da Humanidade. Um livro pode não ter personagens homossexuais, pelo mesmo motivo que não tem gente de todas as raças e credos, porque elas seriam supérfluas, ou mesmo ilógicas, para a estória em questão.
Em segundo lugar, não acho que seja verdade. Muitos livros do género fantástico têm personagens homossexuais. Verdade, em menos quantidade que as heterossexuais e em alguns casos essa classificação não é aceite por todos, contudo, isso não é a mesma coisa que dizer que elas não existem. Um dos casos mais famosos é Albus Dumbledore, cuja sexualidade nunca é discutida nos livros (porque o seria?), mas a própria J. K. Rowling admitiu que na concepção da personagem sempre o considerou homossexual.
“Ó Vitor, isso foi só um golpe publicitário, com certeza!” Talvez, sim. Aliás, é bem provável que assim seja.
Mas a questão aqui não é a veracidade da alegada homossexualidade, mas a irrelevância da sexualidade da referida personagem para a narrativa em questão. Se preferirem outro exemplo: a bissexualidade de diversas personagens (que me lembre, assim de repente, pelo menos seis) de “A Saga dos Otori” por Lian Hearn, pouco ou nenhum peso tem no percurso dos eventos narrados. Claro que, por outro lado, também existem casos do oposto, nomeadamente, na saga “Sevenwaters” de Juliet Marillier, onde a homossexualidade de uma personagem (não direi qual para evitar spoilers, mas os fãs sabe de quem estou a falar) não conduz a narrativa, mas dá pequenos “toques” nela.
Não quero fazer deste post uma mera listagem de livros de fantasia e ficção científica onde surgem ou deixam de surgir personagens homossexuais (até porque isso levaria a muito outros debates e se quiserem entrar por aí, é para isso que servem aos comentários), por isso, limitar-me-ei a indicar que elas existe e que, muitas vezes, apenas não o notamos com mais clareza porque os autores não querem fazer um grande alarido da questão. Porque é que o fariam? A não ser que a estória em si seja concebida para levar a uma reflexão sobre o tema, a sexualidade da personagem é apenas uma entre várias características. Acho que ninguém quer ler sobre uma personagem tão bidimensional que a homossexualidade seja a sua única característica. Aliás, na minha opinião, um autor que use tal personagem, só para dizer que o fez, está apenas a perpetuar um estereótipo e não a representar uma comunidade.
Referido o tema, parece-me lógico que tenho de aproveitar para abordar a questão no âmbito de Crónicas Obscuras. Assim sendo, no próximo post, 26 de Janeiro de 2012: “Sexualidade em Crónicas Obscuras”
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