Tendo em conta que “Crónicas Obscuras” é uma obra de dark fantasy, poderá parecer estranho indicar como influência uma série dramática sobre as vicissitudes da vida e morte num serviço de urgência na Cidade Ventosa. Todavia, ER foi o meu primeiro contacto com narrativas mais complexas (lembrem-se, a série começou em 94), nas quais nem as linhas entre o Bem e o Mal são definidas, nem os “bons” ganham sempre.
Noutras séries (tanto então, como hoje em dia) parte da tensão desaparece quando sabemos que, por pior que seja a situação, nada de muito mau acontecerá aos “bons da fita”, já em ER as coisas não eram assim tão lineares. Podia estar tudo muito bem, o “final feliz” mesmo ao virar da esquina e PUMBA! um acidente matava uma ou duas daquelas personagens mais amadas e nós ficávamos à nora. Para piorar a situação (ou melhor) estas reviravoltas tanto podia acontecer a meio do episódio como no final, o que muitas vezes nos obrigava a ficar em suspenso durante uma semana ou mesmo até ao início da temporada seguinte. Se no início esta imprevisibilidade e a tensão que gerava, me afastou, pois chocava com as minhas noções infantis do que devia ser uma história, depressa se tornou uma das características que me converteu num fã. Agora que já vi todas as temporadas, e muitas dos quais mais do que um vez, já não me afecta da mesma maneira, mas lembro-me de, na altura, passar todos os episódios de sobre aviso, sempre à espera que “a ficha caí-se”, qual lebre assustada.
Com ER aprendi as vantagens de uma história não possuir apenas uma ou duas personagens centrais, sobre os quais assenta toda a narrativa, mas antes um vasto leque, para procurar manter o interesse de vários tipos de leitor. Temporadas houve que não gostava de quase nenhuma das personagens, contudo, continuava a ver os episódios, movido apenas pela possibilidade de aparecerem aquelas duas ou três que eu adorava (e claro, alimentando a esperança de ver a morte de algumas que eu odiava ou adorava odiar. Já agora, com isso em mente, só indicarei isto: temporada 10 episódio 8. Os fãs sabem do que estou a falar…)
Outra coisa que retive da série e que influenciou a minha escrita foi o facto de, apesar de ser uma série sobre médicos, abordar quase todo o espectro de experiências humano, tocando quase todos os temas, desde os mais pesados aos mais leves, fazendo-o não ao ritmo de um tema por episódio, mas antes aos molhos, qual ramalhete dramático. Essa é uma das ideias principais de "Crónicas Obscuras", contar histórias que funcionariam perfeitamente sem os elementos sobrenaturais, sendo este apenas um "tempero" para melhorar o conjunto.
Na série, algumas das histórias mais incríveis e poderosas não nos chegava visualmente, pelos acontecimentos na série ou flashbacks, mas pela boca das personagens, como se fossemos os seus confidentes, com toda a panóplia de emoções que isso proporciona. Procurei aplicar isso há escrita, fazendo que na narrativa o peso do passado e dos eventos que o leitor desconhece se fizesse sentir com a mesma intensidade que a história principal.
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